"Porquê? Eu não compreendo. Explica-me porquê!"
Quem é que nunca disse estas palavras? Quem é que nunca fez estas perguntas? A si mesmo ou a outrem. Monossílabos de amores e ódios momentâneos. Desatinos exacerbados e acesos. Instantes prolongados de erupção pessoal.
Era giro finalizar toda esta profundidade de vão de escada com uma situação de real conflito a que tivesse assistido no comboio: tipo um casal a dissecar a sua relação ou um cidadão a questionar o medíocre governar do nosso país, ou até mesmo um qualquer ser a tornar públicos os devaneios da (sua) auto altercação. Uma cena à filme!
Mas não. Era só um miúdo a quem tinham tirado o telemóvel.
Enquanto o puto contestava a falta do aparelho com ardor contagiante, o "homem", do alto dos seus 20 e tal anos, contava, ao telemóvel, as partidas que andava a pregar. A coisa era elaboradíssima! Nunca antes vista! Uma inovação a nível internacional, digo-vos eu. Não compreendo, ainda, como é que ele foi capaz de partilhar, com tamanha leviandade, uma ideia genial daquelas!
Ele ia às páginas amarelas e ligava anonimamente para pessoas com "nomes esquisitos". Também ligava para "restaurantes xpto, de ricos, tás a ver?" e dizia que era o Pinto da Costa. Enquanto relatava isto tudo ria-se como um perdido, como se aquilo metesse alguma piada a qualquer pessoa com mais de 10 anos de vida.
Para acabar isto em grande só mesmo a minha viagem de metro de hoje. Três paragens, amigos! Uma viagem de TRÊS paragens, apenas, rendeu-me os murmúrios de um chanado que ficou muito ofendido por eu me desencostar dele. Dizia o sujeito que devia ter cara de assassino, que eu estava toda encolhida e que ele não precisava das mulheres do metro. Parece mentira, eu sei... Mas não é.
Serve este post para agradecer a Deus. Ele podia ter-me feito gira, boa e burra (não que uma característica inclua, necessariamente, a outra). Mas não! Em vez disso, deu-me um cérebro.
Um minuto de silêncio por todos aqueles e aquelas que não tiverem a mesma sorte.
Catarina Vilas Boas
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